Editorial
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“Desejo afastar a atenção da sequência psicanálise, psicoterapia, material da brincadeira, brincar, e propor tudo isso novamente, ao inverso. Em outros termos, é a brincadeira que é universal e que é própria da saúde; o brincar conduz a relacionamentos grupais; o brincar pode ser uma forma de comunicação na psicoterapia; finalmente, a psicanálise foi desenvolvida como forma altamente especializada do brincar, a serviço da comunicação consigo mesmo e com os outros.”
Winnicott – O Brincar: uma exposição teórica, 1971
O tema da Revista Mineira de Psicanálise deste ano, “Técnica”, se presta a muitas diferentes interpretações. Pensar a partir da epígrafe acima, da obra seminal de Winnicott O Brincar e a Realidade, nos facilita de certa maneira uma abordagem da nossa forma de brincar, ou de jogar. A psicanálise não é um jogo qualquer, como ele mesmo diz. Trata-se de uma “forma altamente especializada” do jogo, com suas próprias regras e condutas.
Entretanto, isso não significa que seja um jogo que praticamos de maneira uniforme. Os vários desenvolvimentos teóricos e técnicos ao longo dos 120 anos de história da psicanálise nos trouxeram evoluções e variações técnicas enormes: a técnica da análise com crianças, a descoberta da contratransferência, o trabalho ampliado sobre o enquadre, enfim, dentre inúmeras outras questões. Esse número se dedica a algumas delas.
Alexandre Patricio traz, em seu artigo Entre Narrativas e Contemplações: A Interseção da Crítica de Han com a Técnica Analítica Winnicottiana, uma articulação da ideia de crise de narrativa, do filósofo Byung-Chul Han, com desenvolvimentos técnicos da clínica de orientação winnicottiana. Faz uma crítica importante a respeito da experiência de terapeutas que desejam “fazer muito” durante uma sessão, sendo que com isso perdem um pouco a concepção mais existencial do ser autêntico, que demanda outro tipo de tempo e atenção.
José Henrique P. Silva, no texto Aspectos do Manejo Diante da “Ameaça de Colapso”, contribui com aspectos da teoria de Christopher Bollas, que trabalha adaptações necessárias do manejo e do enquadre para o trabalho de angústias profundas dos pacientes, conectadas com a experiência do colapso. Ferenczi e Winnicott: os antiprocustianos, de Luiza Moura, traz inquietantes questionamentos a partir de Ferenczi e a imagem do “divã de procusto”, que teria mais um uso de normatização da teoria, da técnica e, logo, dos pacientes, do que de uma análise necessariamente mais individual dos pacientes, o que conduziria a uma técnica “elástica”.
Adiante, Elaine Guimarães Oliveira escreve, em Intervenções Conjuntas Pais e Filhos: expansões da técnica psicanalítica, sobre um importantíssimo assunto, o trabalho clínico envolvendo não apenas um paciente mas o trabalho realizado com a família, uma evolução técnica que amplia significativamente o campo de trabalho terapêutico.
Ana Paula Terra Machado, com o trabalho Modificações da técnica e do enquadre nas enfermidades somáticas, trata do tema da psicossomática, a partir de autores da Escola de Paris, para discutir o complexo tema destas enfermidades, que durante décadas foi desafiador para os analistas, muitas vezes sendo considerado inalcançável para o trabalho analítico. Para que ele possa acontecer, também serão necessárias adaptações do enquadre para além da chamada “análise clássica”.
Por fim, dentro de nossa seção temática, Estella Santa Bárbara Souza, a partir do artigo Os Limites do Diagnóstico Psicanalítico Clássico, traça um importante panorama das teorias diagnósticas psicanalíticas, partindo de Freud e passando por autores relevantes da orientação lacaniana como Colette Soler e Antônio Quinet.
Ressalta como essa evolução foi importante em termos da ampliação das possibilidades de diagnóstico, a princípio, limitadas nos primórdios da teoria.
Completando nosso número, dentro da Seção “A Produção da SBPMG”, temos o artigo Reflexões sobre a concepção “Urge to exist” em Bion, de nossa psicanalista Gisèle de Mattos Brito (que é parte de seu livro A mente primordial: Entre luz e sombra, lançado pela Editora Blucher). Trata desse relevante conceito da obra de Bion, surgido a partir de necessidades clínicas para abordar aspectos extremamente profundos e dolorosos das partes mais difíceis de acessar da mente dos pacientes, mas que possui papel relevante na compreensão clínica.
Esperamos que a leitura destes trabalhos represente um recorte das ricas e variadas discussões sobre a teoria da técnica e sobre a técnica que ocorrem em nosso tempo, um testemunho da vivacidade do “nosso jogo”, a experiência analítica. Boa leitura!
Leonardo Siqueira Araújo
Editor
Conselho Editorial da Revista Mineira de Psicanálise
Maria Goretti Machado
Kátia Maria Amaral dos Santos
Cecilia Cruvinel Colmanetti Costa
Expediente
REVISTA MINEIRA DE PSICANÁLISE
Órgão Oficial da Sociedade Brasileira de Psicanálise de Minas Gerais – SBPMG
Filiada à International Psychoanalytical Association
Volume 7. 2024
ISSN Nº 2236-8973
Editor
Leonardo Siqueira Araújo (SBPMG)
Conselho Editorial
Maria Goretti Machado (SBPMG)
Cecilia Cruvinel Colmanetti Costa (Membro Filiada SBPMG)
Kátia Maria Amaral dos Santos (Membro Filiada SBPMG)
Projeto Gráfico
Marlon Amâncio
UX Designer & Front-end Developer
Revisão e Diagramação
Carina Souto
Secretária da SBPMG
Diana Ferreira